18 dezembro 2009

LAZER




Estamos embarcando nessa canoa para o Natal e Fim de Ano.
Iremos no Cruzeiro Star Princess.
Navegaremos para Montevidéu, Buenos Aires, Stanley, Cabo Horn, Ushuaia, Punta Arenas, Fiordes Chilenos, Valparaiso.
No nosso retorno mostrarei algumas fotos. Até!

04 dezembro 2009

AUTOBIOGRAFIA




E, o livro exposto a vocês...

LILITH

Sou um escândalo!
Nasci sob o signo de gêmeos, que rege a ambiguidade. Eu deveria ser bem lindinha.
Desde esse momento, muito, muito pequerrucha me doei para minha parteira. Sexualmente.
Quando surgi do além para cá, a Terra, já haviam na casa de meus pais um guri de quatro anos e uma garota de dois.
Nos olhávamos com muita curiosidade, mas nossa mãe parecia muito feliz. Talvez só um pouco por terem uma coisinha a mais a ser alimentada.
Eu não: cheguei, observei tudo e já arquitetei planos, que ainda hoje ponho em prática.
Não é fácil ser a menor de um ninho: não poder não saber articular nada de compreensível na linguagem oral.
E ali fiquei, imóvel, pensando, pensando...
Ainda hoje preciso de tranquilizantes para acalmar o turbilhão dos pensamentos, deixá-los quietos, serenos.
Pouco tempo passara e eu já dominava o campo familiar.
Mas todo o cuidado é pouco: meu cérebro é potente, mas meu físico fraco.
Nunca estive em um parque. Não conhecia um balanço, gangorra, areia, enfim todas as loucuras que uma criança adora.
Estava quase sempre muito arrumadinha, cabelo bem penteado, laço enorme nos cabelos e me conservava quase sempre assim o dia inteiro.
Tinha bonecas mas era obrigada a conservá-las como eu: impecáveis.
Meu pai era militar. Algumas vezes era transferido e nós o acompanhávamos mudando para outras cidades.
Como oficial, ele tinha a seu dispor soldadinhos que serviam em casa: cortavam a grama, faziam compras pesadas. Também nos traziam cavalos para montarmos, meus irmãos e eu.
Minha mãe muitas vezes me castigava com palmadinhas. Eu cometia pequenas faltas e acho que não merecia nenhuma pancada. Talvez, quem sabe, uma conversa franca, mãe e filha. Entenderia sim.
Mas, é claro, teria de ser um diálogo sincero, sem trapaças porque, como já disse, eu já sabia de muitas coisas.
Os adultos vivem subestimando a capacidade de uma garota que nasceu sob o signo de gêmeos.
Tomava banho em uma banheira de bom tamanho. Gostava muito desse momento, principalmente quando podia colocar minhas mãozinhas lá no meu ninho sexual.
Era bom, gostoso. Sempre levava tapas nas mãos, mas nem por isso deixava de repetir o gesto.
Uma das minhas primeiras lições de vida: tudo que é bom é proibido.
A rotina era: hora de banho, hora de apanhar. Mas eu jamais deixaria de me tocar, porque quanto mais doloridas minhas mãos ficavam, mais eu saboreava as envolventes delícias.
Quando ia acontecer o quarto parto, minha mãe morreu. Na mesma época morreu também o meu cachorrinho.
Foi um desastre total: pedir minha mãe e meu cachorro.
Regressamos à Terra Natal. Meu pai proibiu que os parentes de minha mãe nos visitassem. Estávamos isolados.
Fomos para um orfanato. meu pai, às vezes, aparecia e nos trazia bananas. Eu comia até as cascas de tanta fome que sentia.
Viajamos para o Rio de Janeiro. Vivíamos em pensões. Nosso pai não pagava o aluguel do quarto e tínhamos de sair de madrugada, às escondidas.
Éramos um pesadelo para papai. Ele colocou-nos, a mana e eu, em colégios que pareciam clausuras.
Eu achava tudo falso. As freiras não podiam mostrar seus cabelos. Possivelmente exibiam seus pentelhos uma para as outras. Tudo ali era irritante: os "corvos" não tinham compaixão e nos maltratavam com palavras e ações.
Desde tenra idade discordava do que se passava a minha volta. Os padres eram celibatários, mas soube de alguns que freqüentavam a cama dos fiéis.
No sábado de aleluia éramos obrigadas a malhar o Judas, representado por um boneco feioso arrastado por uma de nós e açoitado pelo resto da turma.
Em dias de festa as irmãs de caridade, muito sonsas, pediam ao nosso pai brinquedos para serem colocados nos jogos de pescaria. Naturalmente nós pagávamos para participar.
A bonequinha que consegui em uma dessa pescarias deixou-me muito feliz: iria ter comigo uma coisinha com quem eu pudesse dividir meu fardo e minhas alegrias.
Arrancaram dos meus braços a bonequinha dos meus sonhos logo após meu pai ter ido embora.
Chorei, chorei muito.
Até o próximo ano, quem sabe, minha bonequinha? Eu te tirarei de novo e te direi então que não tive culpa pelo teu abandono. Que nunca deixei de te amar, que gostaria de te dar muito carinho, esse que eu nunca tive, mas que arranjarei forças para produzir-lo em mim e te dar. Minha boneca, nascida dentro de meu orfanato horrível, fedorento e incomensuravelmente triste.
Após muito sofrimento, voltamos ao Portinho.
Papai autorizou que visitássemos nossa avó materna e nos abandonou sem dar notícias.
Minha avó teve de nos alimentar, vestir e tudo mais, praticamente sem dinheiro.
Lembro o meu primeiro Beijo, primeiro noivado e rompimento do meu hímen.
Meu primeiro homem foi meu tio carnal. Quase enlouqueci quando ele sumiu.
Não posso deixar de lembrar também do assédio sexual de uma mulher. Ela me ensinou a acariciar seu corpo e beijar-lhe a boca.
Estávamos quase sempre juntas e eu pretendia assumir esse novo compromisso com muita responsabilidade.
Eu prometia mil coisas a ela.
Era uma mulher casada, mas me prometeu que logo que eu tivesse condições de sustentar-nos, deixaria o marido para viver só comigo.
Eu era apenas uma criança e acreditei.
Um dia, passando pelo nosso quarto, ouvi gemidos: era meu pai e ela.
O mundo desabou!
Ninguém presta.
Os dois juntos, se amando.
Ah Céus! Quanta tristeza, quanta agonia.
Eu tinha apenas 12 anos.
Na minha vida tive três noivados, sempre com grandes festas. Mas eu era insegura e, às vésperas do casamento, caía fora.
Sempre tive sentimentos diferentes das outras meninas, em todos os sentidos.
Eu as amava à minha maneira, às vezes de forma bem maternal, como se fossem minhas filhas.
Mas também as olhava muito, até com desejo.
Desde que nasci sou lésbica.
Contei tudo o que sentia por outras mulheres para o homem com quem ia me casar e ele foi muito compreensivo: disse que isso era imaginação, criancice.
Casamos.
Tive dois filhos.
A menina é normal, perfeita, segundo a ótica da maioria preconceituosa. O menino é como eu: homossexual. Sempre nos demos muito bem.
A minha filha trata-me com indiferença, mas sinto que é quem mais me ama, em realidade. Só não conseguiu me perdoar o abandono.
Sim, eu os abandonei aos quarenta e dois anos de idade, por causa de uma mulher. Oh céus! Se a angústia matasse, eu já estaria morta.
Cristina (este é o nome da minha filha), Cristina, eu te amo.
Volta para mim, minha filha.
Tu não podes esquecer que um dia te abandonei?
Não podes voltar a mim, como fazias antes?
Não consegue me perdoar e aceitar como tua mãe verdadeira, mesmo sendo diferente?
Ou já tens uma mãe substituta?
Filha, eu te amo.
Te amo muito.
E sofro, sofro intensamente.
Tenho saudades.
Tantas que me tiraram à respiração.
Preciso de ti, filha.
Preciso muito.
Preciso do teu amor.
Preciso do teu carinho.
Preciso do teu perdão.
Tu hoje tens doze anos.
Lembro quando eu tinha essa idade.
Sofri tanto, tanto, principalmente porque já, há muito tempo, não tinha mais mãe.
Tu tens Cristina, e não queres saber dela. Por quê?
Estou aqui, pronta a te ajudar.
Estou pronta a te aconselhar, a rir contigo, ouvir teus segredinhos, teus desabafos.
Mas nada ouço de ti, minha filha.
Apenas o silêncio.
Silêncio vazio.
Silêncio que me gela o coração. Coração de mãe que adora sua primeira filha e dela na recebe a não ser uma indiferença tão fria...
De novo interrogo: Por quê?
Estou aqui. Agora e sempre.
Em um dia qualquer de minha vida eu a conheci.
Linda
Maravilhosa.
Imponente.
Minha.
Somente minha.
Primeira mulher séria, definitiva, na minha vida.
Nos amávamos como duas fêmeas selvagens, fogosas, honestas, sinceras,inteiras, uma pela outra. Mulher forte, sexual, doce e agressiva, meiga, amiga, só minha. Se entregou completamente, como sempre desejei.
Só que por ela deixei os bens maiores que já tive: meus dois filhos, Cristina e Claudionor.
Os bens materiais, deixei-os quase todos.
Mas tudo bem.
Joguei tudo para o alto.
Eu tinha na minha cama, no meu lar, a mulher dos meus sonhos, como jamais pensei que pudesse existir...
Depois ela me trocou por um homem muito velho.
Estive hospitalizada na Pinel.
Enfim, tudo passou.
Tive muitos amores, todos falsos e feios.
Parece que nasci tão só para sofrer e fazer os outros infelizes.
Não dá certo nunca.
Perambulo de galho em galho e eles sempre acabam quebrando, precipitando-me ao solo, em tombos dolorosos.
Aquela primeira parceira, da qual ainda lembro, ficou comigo oito anos.
Inclusive morávamos juntas, mas a desconfiança sempre morou conosco.
A criatura afinal, me trocou por um velho burro e porco.
Conclusão lógica: eu valho ainda menos que isso.
Quase enlouqueci de tanto sofrimento.
A pessoinha, essa a quem me estou referindo, após um ano de convivência com o velho, tentou voltar para mim. Mas eu, graças ao meu bom senso, não a quis mais.
Namorei algumas boas velhotas, de vários tipos: muito sexuais, assexuadas, interesseiras, perigosas...
Sinto uma falta imensa da minha filhota que ainda hoje, depois de tantos anos não quis – talvez não consiga – perdoar-me.
Gostaria que num futuro, que espero não seja muito distante, ela possa me entender e chamar para uma comunhão de mãe e filha.
O pai dela é incrível, bom e honesto, acredito que seja o melhor pai do mundo.
Eu nunca o amei.
Ao carneiro só se pode pedir que dê lã.
Passei toda a vida sofrendo, ouvindo mentiras, sendo traída.
Acho que a mulher, por sua natureza, é uma mentira.
Uma delas me disse que não sei controlar meus sentimentos.
Concordo: não sei dosar minhas emoções.
Concordo até com meu psiquiatra.
Só o que nem ele, nem ninguém pode compreender é esse meu desesperado desejo de entrega absoluta.
Mesmo na hora do amor minha maneira é selvagem, de total renúncia, de querer total.
E amo, amo como ninguém no mundo sabe amar.
Se eu sufoco minhas parceiras é porque eu mesma preciso preencher meu vazio interior.
Se sou dominante é porque quero ensinar sempre.
Se amo dessa forma é porque ninguém me ensinou outro tipo de amar.
Aquele velho a que me referi, burro e porco, quase conseguiu uma outra companheira minha.
Tenho uma capacidade mental que eu própria ignorava:
Numa noite escura de Campo Bom fui tomada por um sentimento incontido de ódio por essa criatura asquerosa e desprezível.
Fiquei horas e horas insone e agitada, pensando nesse velho horrível, maquinando sei lá o quê.
Minha respiração estava ofegante, a pressão arterial provavelmente super alterada.
O sono não chegava e já estava quase amanhecendo quando finalmente adormeci.
Fui despertada por esse velho, sujo, sujo em todos sentidos.
Disse-me que passara muito mal à noite. Sentira como se alguém o quisesse matar por asfixia. A garganta lhe apertara e ficara sem ar por alguns momentos.
Nesse instante soube que fora eu que provocara esse desconforto. Fiquei bastante assustada com esses poderes que, na época, interpretei como demoníacos.
Fiz, com todo o ardor, uma prece a Deus e implorei que canalizasse para o bem esse meu dom.
E, no entanto, foi na casa desse velho, que era sapateiro, que vivemos um momento quase perfeito.
Os pingos do chuveiro, que eram apenas três, precisavam ser de todos nós.
E havia aquele violão mágico tocado pelos dedos de um macho gaúcho.
As meninas, no embalo da música, sorriam felizes, como se não fossem ilhas.
Comida gostosa, ovelha no ponto, bebida correndo frouxo por entre gaudérios.
Uma amiga minha, da Cidade, pediu uma faca e para seu assombro, saltaram diante de seus olhos, tantas adagas quanto os peões presentes àquela mesa farta.
Passamos todo o tempo bebendo vinho, de garrafão e os copos eram tantos quanto a alegria que trazíamos no coração.
Quando se está entre amigos tudo é motivo para risadas, orações, bons conselhos, danças e lágrimas emocionadas.
Quando se está entre amigos se está mais perto de nós mesmos.
A saudade da noite tornava o nosso sono mais tranqüilo.
E foi naquele silêncio de Campo Bom que a gente teve vontade de amar muito e dizer ao vento que entre amigos a gente ganha o céu.
Tive mulheres de vários tipos, de vários tamanhos, quadradas, redondas, de várias cores.
Guardei, dentre todas, um exemplar único: uma negra.
A ela, minha poesia:

ORGASMO
“Ela me ofereceu a boca molhada de prazer por me ter.
E se encolheu todinha em mim
Como se eu fosse o único amor de sua vida.
Abriu-me as coxas quentes e roliças
Para que eu sentisse o aroma de seu sexo.
E eu me entreguei todinha a ela
Feliz, muito feliz
Por ter pela primeira vez no meu ninho
A mulata dos meus sonhos.”

Esta poesia eu tentei publicar, mas não aceitaram.
Tornei-a notória agora.
Conheci outra, bem especial, branquinha...
Para ela esta outra missiva:

“Meu homenzinho (é o seu clitóris, muito, muito pequerrucho...)
Te conheci à noite...
Te gostei...
Te desejei...
E te amei...
Te encontrei à noite
E vivi contigo momentos gostosos
Hoje tenho saudades...
Mulher selvagem
Fogosa, amorosa.
Quero te querer
Quero te amar,
Quero tua boca,
Tua língua,
Teu corpo,
Teu tudo.
Quero te comer todinha
Te morder,
Te lamber,
Te proteger...
Quero te ninar,
Conversar contigo,
Te compreender,
Te ouvir.
Quero beijar teus olhos tristes,
Tua boquinha e teus seios...”

Estou satisfeita.
Não deixo nunca de fazer algo que realmente queria.
Um dia, recebi de uma namorada a seguinte carta:

“Minha princesa:
Nesta hora dormes feito um anjo.
Uma e trinta da amanhã e eu estou como uma besta a te imaginar dormindo, a te imaginar de mil formas.
Não sei o que possa ser este sentimento brutal que se passa dentro de mim, esta ânsia louca que sinto de ouvir-te, de tocar-te.
O que será, hem? Podes dizer-me?
Princesinha adorada, quisera tornar-te pequenina e carregar-te dentro de minha orelha ou mesmo no bolso da minha camisa. Mas o que dizer para ti, senão que te amo e que és a coisa mais pura que comigo está acontecendo.
Meus olhos azuis lindos... eles me fitam como os de uma criança assustada, com medo de algo.
Mas de que tens medo? De mim? Te assusto de alguma forma?
Meu anjo, gostaria de entrar na cabecinha loira e tirar todos os medos, conhecer todas as ânsias, os anseios, decepções... Queria saber de tudo; ao mesmo tempo me retraio pois tenho medo de magoar-te, de machucar-te talvez. Tenho medo do desconhecido e ao mesmo tempo me atrai a tua insegurança, a tua insatisfação; deixa-me curiosa e me excita.
Ah, minha princesa, quanto tempo terei ainda para esperar-te. Quero ter-te em meus braços, beijar, beijar, beijar tua boca, teus olhos e, se possível, até tua alma.
Te quero, meu amor, te amo, te como, coisinha gostosa de comer, de lamber, de beijar, de sugar.
Te amo, te amo, te amo.”

Mas durou pouco. Eu gostaria que tu tivesses sido a minha eternidade e acabei recebendo apenas a efemeridade da tua presença.

Hoje meu filho terá o mesmo fim do meu irmão: AIDS.
Pode, quem sabe, acontecer, com o progresso da medicina, um recomeço bom, cheio de esperança.
“Nada acontece por acaso,” já dizia uma grande amiga minha, ex-namorada.
Acredito que com a descoberta desse novo coquetel, meu filho recomeçará com um novo estímulo para a vida, entendo que amar é bom, mas sem promiscuidade, se cuidando mais em suas relações.
Tenho certeza que aprendeu esta nova lição de vida.
Filho, filho meu, porque quase me mataste com tua brutal agressão?
Houve divergências entre nós. Ele me agrediu e ocasionou uma ruptura no meu tendão supra-espinhoso, comprometendo aproximadamente 80% de sua espessura no ombro direito.
Estou tentando fugir da cirurgia, tentando com desespero, resolver clinicamente o problema sério, ocasionado por aquela pessoinha que eu adoro.
É inacreditável quando leio nossas cartas do passado, com juras eternas de amor, amizade, compreensão... mas hoje eu o perdôo de coração.
Que Deus o dirija para que ele não faça uma segunda vez essa atrocidade.
Tentei de várias maneiras fazê-lo entender que quem ama, também pune. Eu o fiz: eu o puni.
Acho que escolhi o caminho certo para puni-lo, mas creio que uma mãe, idosa, indefesa, não poderia ter sofrido tamanha violência de um rapaz cheio de força, de brutalidade, de ódio.
Meu Deus! De meu próprio filho!
Passou, hoje passou. Só restou uma dúvida aqui dentro de meu peito: será que o abandono de ontem, ocasionou isto?
Será que meu filho Claudionor guardou todos estes anos, esta mágoa, para só hoje despejá-la em mim, tentando destruir a casa inteira e me ferindo nos olhos, nariz e boca?
Passou. Hoje está tudo esquecido.
Só não quero vê-lo de novo. Não quero. Não posso mesmo.
Céus! Meu único filho!
O meu único filho homem!
Fica logo bom, filho meu.
Te amo. Te adoro.
Meu irmão querido, tenho tantas saudades tuas. Tanta vontade de te ver. Não quero mais te ver sofrendo, mas cheio de alegria, de vida.
Vontade de conversar contigo, de ficar contigo.
Quando comecei a te conhecer, tu te foste.
Perdi tanto tempo ficando longe de ti.
E eu tinha tanta coisa para te ensinar. E tu, talvez também, tanto a me transmitir.
Te achava tão egoísta, tão sofrido, tão crédulo, inteligente, puro, chato, gastador. Nos nossos momentos finais juntos, te sentia como meu bebê, carente dengoso, medroso. Irmãozinho, que saudade!
Não te preocupes com meu choro agora, quase diário. Vai passar.
Tu querias tanto ver a luz elétrica na chácara. Consegui, consegui! Está lindo! Tudo tão claro!
Tudo o que fiz em minha vida foi por amor. Amor por meus filhos, por meu ex-marido. Amor por mim.
Sempre tive a maior coragem ao tomar decisões importantes, mesmo que elas dilacerassem minha alma.
Sempre tive a incomensurável grandeza de ser sincera, de nunca mentir, colocando a verdade acima de qualquer das minhas atitudes.
Sempre. Sempre.
E hoje estou aqui: só, incompreendida por todos que amei e que ainda amo, porque busquei acertar minha vida de uma maneira autêntica, firme.
Já cansei de rezar, de pedir por uma solução aceitável para todos nós, mas de nenhum lado me vem ajuda.
Meu filho amado, Claudionor, já partiu. Tivemos tempo o suficiente para tudo: Eu tive tempo de o perdoar e ele de se arrepender, sempre lúcido, até o final, ficando encantado com a aproximação saudável do pai comigo. Acredito que nunca deveria ter havido cisão nenhuma entre nós. Nunca saí de casa brigada com ninguém, só saí.
Saí porque precisava mesmo cumprir meu destino, saí para a vida: deveriam ter entendido, nada fiz por mal.

FIM

EXPLICAÇÃO DO TÍTULO





Vou me referir ao prefácio...

LILITH

O título desta autobiografia é bem sugestivo...
Lilith, conforme o Babylonan Talmud é um demônio feminino e noturno de longos cabelos.
Teria sido a primeira mulher de Adão, a anti-Eva e está presente em diversas mitologias além da hebraica (Suméria, Árabe, Persa, etc...)
É a força fêmea que se iguala à grandeza do macho: a Lua com igual poder e até opositora ao Sol.
Mas é também o feminino instintivo, a mulher plenamente erótica, livre, e, por isso mesmo, associada ao mal e ao pecado pela cultura patriarcal.
Segundo Bárbara Kultov, Lilith é aquela qualidade pela qual uma mulher se nega a ser aprisionada num relacionamento. Ela não deseja a igualdade e a uniformidade no sentido da identidade ou fusão, mas os mesmos direitos de se mover, e ser ela própria (O livro de Lilith, 1986).
Lilith assusta homens e mulheres com a intensidade do seu erotismo, mas certamente ambos ganhariam se procurassem compreende-la um pouco.
Não há dúvida que seriam então melhor resolvidos e mais felizes em seus envolvimentos sexuais e afetivos.

30 outubro 2009

PREFÁCIO


Sei lá se devo, se posso, mas vou deixar aqui expresso nesse meu blog o que escrevi sobre retalhos de minha vida.
Vou começar pelo prefácio de meu 1ª livro intitulado Lilith.

Lilith

Esta é uma autobiografia atípica. Desconsertante como a própria autora que, por motivos pessoais, preferiu permanecer incógnita. Mais do que isso, quis que também o prefaciador não se identificasse pois, caso contrário, seria fácil chegar a ela.
É uma confissão intrigante, escrita em estilo telegráfico, como direta é a personalidade dessa mulher, estranhadamente feminina não obstante o preconceito que ainda envolve o lesbianismo.
Não há firulas literárias no texto: a verdade é dita sem pejo nem culpa, embora às vezes os conceitos se enredem nos meandos de uma consciência que fugiu à rigidez de uma educação cristã mas que, inevitavelmente, guarda marcas das cadeias do « moralmente correto.»
O estilo é quase sempre simples, às vezes chocante para os que ainda não conseguiram se libertar dos rótulos. Ocasionalmente os pensamentos emergem como erupções vulcânicas, quase desconexos, porque a escritora não está falando aos leitores mas consigo mesma. Em outras passagens o texto, apesar da crueza é repleto de poesia e erotismo. A linguagem pode até beirar a vulgaridade, às vezes, mas sente-se sempre o sutil perfume de sentimentos muito puros e autênticos.
Este é, sem dúvida, um livro que merece ser lido e meditado.
Para quem julgava que amor com maiúscula só pode existir entre Marte e Vênus, vai surpreender com esta Afrodite nada convencional.
Eu, que a conheço bem e há muitos anos, sei que existe uma continuação deste relato que não foi e talvez não seja nunca escrita. Já se disse que a felicidade não tem história.
Os sofrimentos, principalmente de amor, têm sido os grandes inspiradores das mais belas páginas literárias. E a nossa Lilith finalmente encontrou a paz e o equilíbrio junto a uma alma irmã.
Talvez seja necessário contradizer a antiquíssima sabedoria chinesa: a integração pode ser conseguida de forma diferente do clássico Yn-Yang que simboliza a atração e a fusão dos opostos. Nós que a amamos, estamos felizes por ela.